Capítulo 16

- E agora? – perguntou Marcela, com aflição na voz.
- Eu vou levar vocês para um hotel – explicou Flávio.
- Mas e o senhor Sérgio? Ele vai contar pro meu pai...
- Ele não sabe que vocês estão aqui comigo.
- Mas ele vai descobrir! E vai contar pro meu pai!
- Marcela, o seu pai nunca vai descobrir onde vocês estão, eu lhes prometo isso. Vocês estão a salvo agora.

Marcela respirou aliviada.

Clara estava abraçada a ela, escondendo o rosto em seu peito, sem olhar o caminho que estavam percorrendo.
Mas Dora permanecia com semblante preocupado, aflito.

- Vai dar tudo certo, Dona Dora, fique tranquila – Flávio tentou apaziguar as coisas.

Mas Flávio sabia que não seria fácil.
A batalha estava apenas começando, e o que viria a seguir iria demandar muita coragem por parte dele para enfrentar a ira de Sérgio e Letícia.

Deixou Marcela, a mãe e a irmã num hotel.
Não foi embora sem antes deixar uma série de recomendações: poderiam pedir o que quisessem, mas não poderiam dar muitos detalhes de quem eram e de onde vieram.
Deixou um cartão de crédito com Marcela, para que comprasse roupas para elas.
Ela nem imaginava como que se usava aquilo, mas prestou muita atenção nas explicações que Flávio deu.
Pediu para que elas não abrissem a porta para ninguém que não fosse funcionário do hotel.

No caminho de volta para a empresa, Flávio ensaiava na sua cabeça tudo o que falaria para Sérgio.
Pensou em cada hipótese, em cada situação que poderia acontecer naquele confronto.
Montou a cena e a repetiu diversas vezes até decorar.
Chegou a falar sozinho algumas vezes. Passou pelo lobby, apetou o botão do elevador, enquanto continuava repetindo pela milionésima vez todo o script.
“Isso precisa dar certo!”, disse para si mesmo, enquanto enchia-se de coragem.
Quando as portas do elevador se abriram, Flávio já escutava os gritos de Sérgio, xingando-o de maluco, incompetente, traidor, e outras palavras que preferiu esquecer.

- Onde você estava, seu desgraçado? Sabe há quantas horas estou te procurando?
- Por quê? O que aconteceu?
- Mas além de tudo é dissimulado também?
- Por favor, senhor Sérgio, me explique...
- Então eu confio à você uma missão de vida ou morte, e você, além de não obter êxito, ainda agride um dos moradores e sequestra sua amante, a mãe e a irmã dela? O que você pretende com isso, meu jovem? Me destruir de vez?
- Amante? Sequestro? Isso não faz sentido!
- Sentido? Recebi uma ligação de uma moradora, dizendo que você agrediu o pai dela e sequestrou parte da família! Você é louco?

Lúcia! Ela não deixaria barato o fato de ter sido “abandonada” na Vila.
Não era assim que Flávio havia planejado.
Nem em mil hipóteses que levantou em sua mente, poderia imaginar que ela se adiantaria e ligaria para Sérgio.
Ele queria contar para o sogro tudo o que aconteceu, com calma, medindo palavras, tudo muito bem planejado.
Tudo o que Flávio menos queria era começar uma briga, que com certeza viraria uma guerra.
Mas, por outro lado, talvez se tivesse começado com tanta calma, não teria oportunidade de dizer tudo o que estava engasgado em sua garganta há tanto tempo, comprimindo seu peito, impedindo que ele fosse completamente feliz e livre.
“Ah, que se dane!”, pensou.

- Senhor Sérgio, sou imensamente grato por tudo que o senhor fez por mim.
- Acho bom que seja mesmo, rapaz! Se não fosse por mim, você estaria morando em uma lata de lixo agora.
- Provavelmente, senhor, é possível que sim. Mas, graças ao senhor eu tive a oportunidade de estudar, de ser alguém na vida e de aprender muitas, muitas coisas.
- Me poupe dessa conversa fiada. Essa parte da história eu já sei. Eu quero é que você me explique porque diabos está querendo me destruir.
- Não estou querendo destruir ninguém, senhor! O senhor sabe muito bem que não me mandou para uma missão de vida ou morte. O senhor me mandou para uma missão suicida.

- Não tenho culpa se você é um incompetente, que não sabe contornar uma simples reivindicação de uns sem eira nem beira.
- O senhor sabe que não é simples. Sabe que a situação lá é grave. Os únicos que estão entre a vida e a morte são aqueles pobres trabalhadores. Não o senhor
- Pobres trabalhadores??? Você fala como se eles fossem coitados. E de coitados aqueles pilantras não têm nada! Eles sabem dos riscos. Estão lá porque são gananciosos, porque acham que vão enriquecer rapidamente.
- Não! Eles estão lá porque não têm outra alternativa, porque essa foi a única forma que encontraram de sustentar suas famílias, e porque acreditaram no senhor, e nas promessas que o senhor fez.
- Eu não fiz promessa nenhuma!
- Fez! O senhor, os fez acreditar que poderiam sim enriquecer ali.
- Mas que petulante! Cada um acredita no que quiser!

- E aquela moça que eu resgatei, juntamente com sua mãe e uma de suas irmãs, ela não é minha amante. Elas são apenas pobres criaturas, que vivem uma vida de abusos.
- E como você sabe disso, rapaz? Estava na cama com elas, ao invés de fazer o que lhe mandei, que era convencer aqueles ordinários?
- Olha, senhor Sérgio, se o senhor quiser me ofender, tudo bem. Mas por favor, não ofenda essas pobres mulheres. O senhor Não faz ideia do quanto elas apanham daquele homem!

- E eu estou lá me lixando para o que acontece ou deixa de acontecer com as prostitutas daquele lugar!? Eu quero mais é que todos se danem! Contanto que aqueles vagabundos tenham onde e com quem descarregar o excesso de testosterona, para que trabalhem direito, isso é que importa. Pegue já aquelas vadias, seja lá onde você as escondeu, e leve-as de volta para casa, antes que o imundo do pai delas me apareça aqui, cobrando satisfações. Deus me livre de pegar os germes daquela criatura! E faça tudo em silêncio, antes que a maluca da irmã delas chame a imprensa. Odeio ser ameaçado por meretrizes. Limpe a sujeira que você fez, imediatamente! É uma ordem, seu insolente!

Flávio não acreditava no que estava ouvindo.
Naquele momento era como todo o seu mundo tivesse caído.
Ele olhava aquele estranho na sua frente, que julgou conhecer todo aquele tempo, e pensava como foi capaz de admirá-lo tanto, de um dia ter tido vontade de ser como ele.
A única coisa que sentia por aquele homem naquele momento era nojo, repulsa, revolta.

Num gesto impensado, consumido pela raiva, não teve dúvidas: fechou o pulso e meteu um soco bem forte no olho direito de Sérgio.

- Seu moleque idiota! O que você pensa que está fazendo? Eu vou acabar com você, seu desgraçado ingrato! Você nunca mais irá arrumar trabalho nesta cidade! Eu jamais deveria ter te tirado da pocilga onde você morava! Uma vez marginal, sempre marginal! Suma daqui antes que eu chame a polícia!
- Não se preocupe, senhor Sérgio. Não pretendo permanecer nesta cidade de ladrões e corruptos. E chame mesmo a polícia. Quero ver o senhor explicar a eles toda a origem do seu dinheiro.
- E você acha que eles não sabem, seu idiota? O mundo é dos inteligentes, rapaz. Todos querem dinheiro. E para ter dinheiro é preciso fazer parte do esquema. Você acha mesmo que existe alguém que não seja comprável?

- Bom... Eu não sou. Então talvez sim, deve existir sim alguém que não seja comprável.
- Pense novamente, seu marginalzinho ingrato. Você se vendeu pra mim até agora.
- Pense novamente o Senhor! Eu não me vendi. Eu apenas não sabia da verdade.
- Hipócrita! Vai dizer que não gostava da boa vida na mansão que eu dei pra você morar, da mulher que você tinha e todos os seus amigos cobiçavam, dos sapatos, ternos, camisas, gravatas caríssimas que você usa? Você até aturou ser corno e mal tratado por sua mulher em troca dessa mordomia toda!
- O senhor está equivocado. Eu só aturei isso porque eu amava a sua filha. Fiz tudo isso, aceitei tudo isso porque queria estar perto dela, e achei que se me tornasse alguém da mesma posição que vocês, ela chegaria a me amar também. Mas isso nunca aconteceu.

- Sabe por que isso nunca aconteceu? Porque não importa o que você veste, ou quanto dinheiro você tenha. Você é e sempre será um marginal! Ou você nasce em berço de ouro ou não nasce. Você não se torna nobre. Você nasce assim.
- Pois é, senhor Sérgio. Já eu acredito que ou você nasce com caráter, ou você não nasce. Você não adquire caráter. Você já nasce com ele.
- SUMA DAQUI, SEU MARGINAL! E não pense que você levará consigo um tostão furado do MEU dinheiro! Vou cancelar todos os seus cartões de crédito, seu imbecil! Não volte para a casa da minha filha para pegar nenhum pertence! Você só vai sair daqui com a roupa do corpo!
- Com o maior prazer! E não se preocupe. Sou perfeitamente capaz de trabalhar por meu próprio sustento.
- E não abra sua boca para ninguém, ou eu te mato!

- Não vou abrir, senhor Sérgio. Na verdade, quando eu passar por aquela porta ali, eu já terei esquecido da sua existência, da existência da sua infeliz família, da sua fajuta empresa e sua vazia cidade.

Flávio virou as costas e saiu daquele lugar horrível, enquanto Sérgio continua disparando mais e mais insultos.
Não olhou para traz. E nem precisava. Sua missão estava cumprida e sua alma estava lavada.
Mas ele sabia que tinha mais por vir.
Clemente e Lúcia estavam sedentos por vingança e ele precisava se preparar para ela.

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